terça-feira, 6 de março de 2012

Jurisprudência - Compra e venda comercial, Coisa defeituosa

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo: 2698/03.9TBMTJ.L1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: MOREIRA ALVES
Data do Acordão: 06-03-2012
Votação: UNANIMIDADE

Sumário :

I - Sendo a compra e venda objectivamente comercial – art. 463.º, n.º 1, do CCom –, apesar de ser subjectivamente civil – art. 464.º, n.º 2, do CCom –, o contrato assume, no seu todo, natureza mercantil, como resulta do disposto no art. 99.º do CCom.

II - O segmento final do art. 99.º do CCom não afasta a aplicação à parte não comerciante da disciplina prevista no Código Comercial, para aquele tipo contratual, pois, de contrário, esvaziar-se-ia o princípio geral contido na norma: essa excepção refere-se apenas àqueles actos que ali são regulados para se aplicarem exclusivamente aos comerciantes, como, por exemplo, as que determinam a obrigatoriedade de adoptar uma firma, de terem uma escrituração comercial, de dar balanço ou prestar contas, ou que fixam regras quanto à prova de certos actos.

III - O prazo curto de 8 dias, a que se refere o art. 471.º do CCom, não foi estabelecido em benefício do vendedor comercial, e tem a ver, essencialmente, com a celeridade, segurança e certeza que o legislador quis imprimir à contratação comercial, tanto se verificando para a compra e venda condicional, dos arts. 469.º e 470.º do CCom, como para a compra e venda pura, sujeita ao regime comercial.

IV - O mencionado prazo de 8 dias só pode contar-se a partir da entrega da mercadoria, quando, nesse prazo curto, a simples inspecção dela habilita o comprador a aperceber-se da desconformidade e, consequentemente, a protestar e rejeitar a coisa entregue. Diferentemente, se o defeito é tal que só com exames especiais, designadamente laboratoriais, pode ser detectado, o prazo só se iniciará decorrido o período de tempo razoável e necessário, conforme as circunstâncias, para que o comprador tome conhecimento do defeito, agindo com a diligência devida.

V - Recai sobre o comprador o ónus de provar a impossibilidade de detectar o vício ou defeito no prazo de 8 dias após a entrega, bem como da data em que, depois de uma conduta diligente, tomou dele conhecimento.

VI - No caso concreto, sendo a autora/compradora uma empresa que exerce profissionalmente a actividade de fabricante de cortiça, e estando provado que o defeito existente era apreensível a olho nu, por qualquer pessoa que habitualmente trabalha com cortiça, sem necessidade de qualquer exame especial ou laboratorial – como a autora alegou, mas não provou – era exigível à autora, em termos de diligência normal, que, quer por intermédio dos seus representantes, quer através dos seus colaboradores, procedesse ao exame da mercadoria logo após a entrega da última partida de cortiça entregue pelo réu, em ordem a controlar a sua qualidade.

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