Acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça
Processo: 2698/03.9TBMTJ.L1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: MOREIRA ALVES
Data do Acordão: 06-03-2012
Votação: UNANIMIDADE
Sumário :
I - Sendo a compra e venda
objectivamente comercial – art. 463.º, n.º 1, do CCom –, apesar
de ser subjectivamente civil – art. 464.º, n.º 2, do CCom –, o
contrato assume, no seu todo, natureza mercantil, como resulta do
disposto no art. 99.º do CCom.
II - O segmento final do art. 99.º do
CCom não afasta a aplicação à parte não comerciante da
disciplina prevista no Código Comercial, para aquele tipo
contratual, pois, de contrário, esvaziar-se-ia o princípio geral
contido na norma: essa excepção refere-se apenas àqueles actos que
ali são regulados para se aplicarem exclusivamente aos comerciantes,
como, por exemplo, as que determinam a obrigatoriedade de adoptar uma
firma, de terem uma escrituração comercial, de dar balanço ou
prestar contas, ou que fixam regras quanto à prova de certos actos.
III - O prazo curto de 8 dias, a que se
refere o art. 471.º do CCom, não foi estabelecido em benefício do
vendedor comercial, e tem a ver, essencialmente, com a celeridade,
segurança e certeza que o legislador quis imprimir à contratação
comercial, tanto se verificando para a compra e venda condicional,
dos arts. 469.º e 470.º do CCom, como para a compra e venda pura,
sujeita ao regime comercial.
IV - O mencionado prazo de 8 dias só
pode contar-se a partir da entrega da mercadoria, quando, nesse prazo
curto, a simples inspecção dela habilita o comprador a aperceber-se
da desconformidade e, consequentemente, a protestar e rejeitar a
coisa entregue. Diferentemente, se o defeito é tal que só com
exames especiais, designadamente laboratoriais, pode ser detectado, o
prazo só se iniciará decorrido o período de tempo razoável e
necessário, conforme as circunstâncias, para que o comprador tome
conhecimento do defeito, agindo com a diligência devida.
V - Recai sobre o comprador o ónus de
provar a impossibilidade de detectar o vício ou defeito no prazo de
8 dias após a entrega, bem como da data em que, depois de uma
conduta diligente, tomou dele conhecimento.
VI - No caso concreto, sendo a
autora/compradora uma empresa que exerce profissionalmente a
actividade de fabricante de cortiça, e estando provado que o defeito
existente era apreensível a olho nu, por qualquer pessoa que
habitualmente trabalha com cortiça, sem necessidade de qualquer
exame especial ou laboratorial – como a autora alegou, mas não
provou – era exigível à autora, em termos de diligência normal,
que, quer por intermédio dos seus representantes, quer através dos
seus colaboradores, procedesse ao exame da mercadoria logo após a
entrega da última partida de cortiça entregue pelo réu, em ordem a
controlar a sua qualidade.
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