Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo: 1239/11.9TBBRG-E.G1.S1
1ª SECÇÃO
Relator: HELDER ROQUE
Data do Acordão: 19-06-2012
Sumário :
I - A exoneração do passivo restante é um regime
particular de insolvência que redunda em benefício das pessoas
singulares, com vista à obtenção do perdão da quase totalidade das suas
dívidas remanescentes, mas que não tem por objectivo específico as
dívidas da massa insolvente, representando um desvio enorme na
finalidade, última do processo de insolvência, da satisfação dos
interesses dos credores.
II - Só depois da satisfação do interesse do
devedor, surge, em segundo plano, como finalidade do instituto, a
realização de um relevante interesse económico, ou seja, o da rápida
reintegração do devedor na vida económico-jurídica.
III - Podendo ser titulares de empresas comerciais as sociedades e os comerciantes individuais, sendo, in casu,
os requerentes da insolvência “representantes e sócios/accionistas de
sociedades comerciais”, não são «titulares de uma empresa», nos termos e
para os efeitos do preceituado pelo art. 18.º, n.º 2, do CIRE.
IV - A existência do elemento «prejuízo para os
credores», não decorre, automaticamente, do teor literal da al. d), do
n.º 1, do art. 238.º, do CIRE, não tem natureza objectiva, tratando-se
de um pressuposto independente da tardia apresentação do pedido de
insolvência, devendo antes ser, concretamente, apurado, em cada caso,
com afastamento terminante de qualquer tipo de presunção de prejuízo,
que carece sempre de demonstração efectiva.
V - Ao contrário do que acontecia com o regime
estabelecido no CPEREF, que estatuía a cessação da contagem dos juros
“na data da sentença da declaração de falência”, os juros passaram com o
CIRE a ser considerados créditos subordinados e, como tal, a vencer-se
após a apresentação à insolvência, não ocasionando o atraso desta, por
si só e independentemente de outras circunstâncias, qualquer prejuízo
para os credores.
VI - A apresentação tardia do
insolvente-requerente da exoneração do passivo restante não constitui
presunção de prejuízo para os credores, pelo facto de, entretanto, se
terem acumulado juros de mora, competindo antes aos credores do
insolvente e ao administrador da insolvência o ónus da prova de um
efectivo prejuízo, que, seguramente, se não presume.
VII - Os fundamentos determinantes do
indeferimento liminar do pedido de exoneração do passivo restante não
assumem uma feição, estritamente, processual, uma vez que contendem com a
ponderação de requisitos substantivos, cuja natureza assumem, não se
traduzindo em factos constitutivos do direito do devedor a pedir a
exoneração do passivo restante, mas antes em factos impeditivos desse
direito, razão pela qual compete aos credores e ao administrador da
insolvência a sua demonstração.